A Corte Portuguesa no Brasil
1808 = A Corte Portuguesa no Rio de Janeiro
Autor: Aníbal de Almeida Fernandes, Novembro, 2009.
1) Situação em Portugal: A Europa está devastada
pelo furacão Napoleão que mexeu em todos os tronos europeus e, no fim de
1807, está chegando em Portugal. É a madrugada de 27/11/1807 e a
corte, desesperada, se atropela com pressa e desordem no cais de Belém
para embarcar, filhas sem pais, mulheres sem marido, pessoas da mais
alta nobreza que esperam subir a bordo com a roupa do corpo e com pouco
ou nenhum dinheiro. Mais de 700 carruagens trazem a família real e
seus pertences,
D. João chegou acompanhado de D. Pedro
Carlos, infante de Espanha, primo de Carlota Joaquina, e tomam a nau
capitânia Príncipe Real com 67 m. de comprimento que recebe mais de
1.000 passageiros e é a sala do trono flutuante da monarquia portuguesa,
logo depois chegam Dona Carlota, D. Pedro, as infantas e o infante D.
Miguel, e se dividem em 4 navios, por questão de segurança dinástica,
D. Pedro e D. Miguel embarcam com o pai; dona Carlota e 4 filhas
embarcam na fragata Alfonso de Albuquerque; espera-se a rainha, Dona
Maria 1a, a Louca, com 73 anos que, aos urros entremeados de lamúrias e
exclamações de
Ai Jesus!, Ai Jesus!, recusa-se a embarcar,
pois quer ficar com o povo e resistir e, finalmente, é carregada nos
braços pelo comandante da frota real e embarca no
Príncipe Real. As 2 princesas do meio embarcam na Rainha de Portugal enquanto a tia e a cunhada de D. João embarcam no
Príncipe do Brasil.
Trazem consigo, metade do tesouro português, algo em torno de 80
milhões de cruzados, a outra metade já fora quase toda gasta para
comprar a neutralidade com a França de Napoleão, sequiosa dos tronos
europeus, e o que resta em Lisboa, cerca de 10 milhões de cruzados, não
dava para mover o reino e pagar as dívidas, o que fará o general
francês Junot derreter toda a prataria das igrejas e palácios para
pagar a manutenção das tropas de ocupação em Portugal, na guerra que se
seguirá e que matará 250.000 portugueses, ou seja, 1/12 da população
portuguesa.
A transferência para o Brasil já fora sugerida, no séc. XVII, pelo
famoso padre Antonio Vieira, conselheiro de D. João 4o (1641-1656).
Depois, com a crescente penúria de Portugal e a enorme riqueza que vinha
do Brasil, Luis da Cunha, diplomata de D. João 5o (1706-1750),
reexamina a mudança proposta por Vieira, pois acha muito mais racional
administrar o Brasil
in situ. Com o furacão napoleônico, a
loucura de D. Maria 1a e a crescente insegurança de Portugal, a
transferência voltou a ser cogitada por Rodrigo de Sousa Coutinho, (que é
filho de um governador de Angola, no tempo do Marquês de Pombal, de
quem é afilhado), e foi pelo Marquês educado para representar a nobreza
instruída, ativa e preparada, futuro Conde de Linhares, que declara à
Corte em 1798:
que os domínios na Europa já não constituíam a capital e o centro do império Português.
A situação européia está muito complicada por conta da exigência de
Napoleão do Bloqueio Comercial contra a Inglaterra. Em 1806, o espanhol
Manoel de Godoy 1o Ministro de Carlos 4o, e amante da rainha Maria
Luisa, procura efetivar junto a Paris a partilha de Portugal em 3
partes: ao Norte a Etrúria, com o Minho e o Douro tendo o Porto por
capital que seria entregue ao genro de Carlos 4o, Luis de Parma, como
Rei de Etrúria, o Sul com o Alentejo e o Algarves fica para Godoy que
terá o titulo de príncipe dos Algarves, o Centro com a Beira, Trás os
Montes e Estremadura fica para os Bragança tendo Carlota Joaquina como
regente. Em julho de 1807 o embaixador português em Paris recebe um
ultimato para que Portugal rompa as relações com a Inglaterra. A
3/11/1807 Portugal concorda e manda pelo Marquês de Marialva diamantes
brasileiros para acalmar Napoleão e solicita a Lord Strangford, o
embaixador inglês de 27 anos tradutor de Camões, que se retire do país; a
18/11 Strangford pede o passaporte, fecha a embaixada e se abriga na
esquadra inglesa ao largo de Lisboa, comandada por sir Sidney Smith,
sendo que, os navios HMS Marborough, Bedford, London e Monarch sob o
comando de Graham Moore escoltariam a frota portuguesa até o Brasil.
Esta
proteção inglesa seria duramente cobrada pela
Inglaterra através de um tratado feito por Lord Strangford em 1810, com
total apoio de Rodrigo de Sousa Coutinho que por tal auxílio recebe,
como cortesia, um retrato de Jorge 3o da Inglaterra com enfeites de
diamantes e uma caixa de diamantes. Este malfadado tratado, pessimamente
recebido pela Corte, atinge diretamente a soberania do reino com as
seguintes particularidades: os ingleses estariam sujeitos somente à sua
própria justiça, seus navios de guerra teriam acesso ilimitado às águas
brasileiras e, quando em missão de proteção, eles seriam abastecidos
pela Corte, a madeira brasileira poderia ser usada para a construção
naval britânica, os ingleses poderiam negociar, e possuir propriedades,
sem nenhuma restrição, não estariam sujeitos à Inquisição e teriam
liberdade de culto, e o pior de tudo, a mais escandalosa sujeição, para
os ingleses as taxas seriam apenas de 15% enquanto que para os
brasileiros e portugueses a taxa era de 16%!!! Alem disso, o altíssimo
custo de instalação da Corte, que estava falida, no Rio obrigou D. João a
obter um empréstimo de 600.000 libras da Inglaterra para manter
funcionando a gigantesca burocracia da Corte dando como garantias de
pagamento as receitas do arquipélago da Madeira e o monopólio da Coroa
sobre o pau-brasil, receitas que eram vitais para o reino. Portugal já
vinha, desde a época pós-descobrimentos, perdendo sua importância e
força econômica e política no contexto mundial, que fora imensa com mais
de 50 fortes ao longo das ricas costas asiáticas que dominavam as
rotas e transações comerciais que davam lucros extraordinários para
Portugal, pois, infelizmente, a tenacidade, competência técnica,
empresarial e logística que demonstrara e o fizera dono do comércio
global acabara. Dois fatos causam um enorme prejuízo às finanças do
reino: a Restauração dos Bragança, após o domínio espanhol de 1580 a
1640 custou muito caro, pois o auxilio inglês significou o casamento da
filha de D. João 4o com o rei Carlos 2o da Inglaterra em 1661 e, para
isso, houve o dote de 2 milhões de cruzados e a entrega da região de
Tanger e Bombaim. A alegada expulsãodos holandeses de Pernambuco, em
1654, que fora o local mais rico do mundo colonial português com sua
exportação de açúcar atingindo 700 mil arrobas/ano, fez com que, entre
1661 (Tratado de paz de Haia) e 1730, Portugal tivesse que pagar à
Holanda, 4 milhões de cruzados de indenização, além de entregar o
Ceilão e as ilhas Molucas para a Holanda.
Por conta dessa desastrada política de entrega de patrimônio e perda
de renda, em 1800 Portugal já está sem força, pois acabara o dinheiro
que vinha do Brasil, cujo apogeu foi entre 1750 e 1760, quando se estima
que veio uma fortuna de 2.500 toneladas de ouro e 1,5 milhões de
quilates de diamantes (
ou 1.094 toneladas de ouro e 3 milhões de quilates de brilhantes),
que ajudou a reconstruir Lisboa destruída pelo terremoto ao tempo de
D. José 1o e do Marquês de Pombal cuja energia, dinamismo e autoridade
tiraram Portugal da letargia em que estava desde a época
pós-descobrimento abrindo as portas da Corte para os riquíssimos
comerciantes que queriam ser nobres, aliás, como já fizera D. João 5o,
visando conseguir recursos para manter o fausto da Corte empobrecida.
Portugal era um país em acelerado processo de decadência, como
metrópole autônoma, pois começou dando ao comerciante inglês as
condições de igualdade com o português, avançou a ponto de sacrificar
nossa indústria em prol da britânica e acabou por concordar em eliminar
a lavoura brasileira para favorecer a agricultura das colônias
inglesas das Antilhas.
2) A Viagem: A esquadra era provavelmente composta
de 8 naus, 3 fragatas, 2 brigues, 1 escuna de guerra, 1 charrua de
mantimentos e vários navios mercantes da marinha portuguesa num total de
56 barcos conforme os registros de bordo recuperados por Kenneth
Light, ou 36 velas conforme Lord Strangford, ou mais de 30 barcos, como
relada Kirsten Schultz. Quanto ao número de emigrados varia
enormemente, temos 15.000 (Schultz, 1998), minuciosos 13.800 (
Rocha Martins IHGB, 1910), entre 8.000 e 15.000 (
Manchester, Transferência da Corte para o Brasil) e, hoje em dia, fala-se no total de apenas 522 pessoas sendo 420 civis e 102 militares (
Esparteiros, 1979, que aparecem no Almanaque da cidade do Rio de Janeiro de 1811, ou na Gazeta), citado por Nereu Cavalcanti,
no Rio de Janeiro setecentista, porém, Kenneth Light, no livro
The Migration of the Royal Family, baseado na carta que o comandante inglês, James Walker, do
Bedford, enviou ao Almirantado em Londres informa que, só no
Príncipe Real (
com 67 m. por 16,5 m.)
estavam 1.054 pessoas e, alem disso, ele avalia que de tripulantes
havia entre 6.000 a 7.000. Nesta animada celeuma/controvérsia eu opino
que deveria haver entre 5.000 e 10.000 fugitivos uma vez que, apenas na
nau
Príncipe Real viajavam 1.054 pessoas, o que demonstra que
essa quantidade de barcos (56 ou 36) era excessiva para trazer apenas
502 pessoas?? Há que se considerar que, pelos usos e costumes da época,
a Família Real era servida tanto por famílias nobres como por enorme
criadagem. Para a grandeza desses números, temos como referencia, o
palácio de Versalhes no séc. XVIII, onde havia 6.000 pessoas a serviço
da família real, entre nobres da mais alta estirpe que vestiam e
serviam as refeições ao Rei e a criadagem que limpava o palácio,
inclusive da urina e fezes da multidão que não tinha banheiro para
usar. O Príncipe de Condé, primo do rei, num jantar para apenas 8
convivas, tem 25 empregados servindo à mesa, fora a
équipage de apoio interna, para surpresa do embaixador inglês.
A esquadra deixa a barra do Tejo às 7,00 h. de 29/11/1807. A frota
chegou a ser avistada por Junot quando chegou a Lisboa e, daí, vem o
dito
ficou a ver navios. Muitos nobres do velho regime não quiseram fugir, ainda abalados com o
Massacre dos Távoras,
em 1759 que supliciara membros da mais alta nobreza: o Duque de
Aveiro, o Marques e Marquesa de Távora e o filho Marques novo de Távora
e o Conde de Atouguia, feito na época do Marquês de Pombal, o enérgico
1o Ministro de D. José. Alguns nobres aderem ao inimigo e se apressam a
fazer rapapés ao General Junot e a sua mulher Laura, Duquesa de
d’Abrantès, que era da alta sociedade napoleônica, convidando-os para
recepções. A viagem é cheia de privações, não há água corrente nem
banheiros e as necessidades fisiológicas eram feitas em plataformas
suspensas sobre a amurada dos navios, alem disso, na pressa do
embarque, água, víveres, roupa de cama foram deixados no cais e
precisam solicitar lençóis e cobertores da marinha britânica. Não há
roupa de baixo para troca e na Alfonso de Albuquerque há uma infestação
de piolhos que obriga as mulheres a raspar a cabeça, começando com
Carlota Joaquina e as princesas reais. Não há nenhuma privacidade e
alguns nobres têm que dormir no convés ao relento, sem camas nem
cobertas, sendo molhados pelo mar. A frota se divide após tempestade na
ilha da Madeira, e a
Príncipe Real e a
Alfonso de Albuquerque à 22/1/1808, após 54 dias chegam a Salvador (
46.000 habitantes) e onde a família real pisa o solo brasileiro pela 1a vez para agitação dos baianos que não os esperavam,
aí ficando até 26/2/1808,
seu primeiro compromisso oficial foi uma missa na catedral da Sé.
Entretanto a Rainha de Portugal e a Príncipe do Brasil seguiram direto
para o Rio, chegando a 17/1/1808, onde os viajantes permanecem a bordo
aguardando a chegada do resto da esquadra, com a rainha Dona Maria e o
regente D. João.
3) A chegada no Brasil: Finalmente a corte reunida
desembarca, às 15 horas de 7/3/1808, no Rio de Janeiro cuja população
total era de 60.000 almas, das quais quase metade eram escravos negros e
recebe esta multidão de emigrados precariamente. A chegada à baía da
Guanabara é assim descrita por um viajante da época:
Não existe viajante algum que, tendo visto o Rio, não fale com
admiração do magnífico espetáculo proporcionado pela baía da cidade.
Esta baía é ainda mais vasta que a baía de Constantinopla, pois tem 5
léguas de extensão por ¾ de milha de largura, é defendida por rochas
graníticas de efeito grandioso e poderia acolher todas as frotas do
mundo sem amontoamento.
Quando se entra na baía, após o sofrimento da longa travessia, fica-se comovido com o esplendor do panorama:
Porém que decepção se sente, oh meu Deus, quando se sai do
ancoradouro?! Os perfumes que vem da baía são infectos!! A explicação é
simples, a água das casas era transportada pelos escravos de várias
fontes em barris semelhantes aos que, no fim da tarde, carregavam os
detritos, pois as casas não têm fossa séptica já que o lençol freático,
por causa do solo pantanoso, está muito próximo da superfície e todos
os detritos domésticos são postos em barris que os escravos põem sobre a
cabeça e vem, em procissão, para o mar onde os jogam, dá para imaginar
o mau cheiro com o terrível calor do lugar, esses negros são como o
símbolo da cidade. E o ponto onde jogam é próximo ao palácio e quem
estiver na janela, não pode deixar de ver os horrorosos barris, que vão e
vem na água da baía ao cair da tarde e cujo odor se faz sentir até o
fundo dos quartos do Palácio Real e do Hotel Pharoux, que hospeda os
estrangeiros e fica inabitável conforme a direção do vento. Mais tarde,
uma viajante francesa diz que as margens da baía não passam de um vaso
sanitário infecto e as praias que pareciam tão belas do navio, eram o
receptáculo das imundícies de toda a cidade!!!!
A cidade andava extasiada com as notícias de que estava próximo o dia
do rei, em pessoa, estar na exuberante, e acanhada, capital tropical e
o vice-rei e capitão geral do Brasil, Dom Marcos de Noronha e Brito,
apoiado pelos grandes da terra, preparava a recepção e a instalação da
corte, dando exemplo ao despejar-se, a si próprio, do palacete em que
vivia para cedê-lo aos ilustres migrantes sem teto. E Portugal, da
Inglaterra e França, fortes comerciantes, da Itália vários artistas, da
Áustria sábios naturalistas e da costa da África, pretos de várias
compleições, num total de 5.000 a 10.000 pessoas. Na realidade, não
resta opção para os moradores, pois uma das primeiras leis baixadas pelo
regente, D. João, foi o direito de aposentadoria que consta das
Ordenações do Reino, nos livros 2 e 4. Essa prerrogativa de aposentos
(lugar para morar, daí aposentadoria) era oferecida às pessoas dotadas
de privilégios, que detinham os diversos cargos públicos, civis,
militares e eclesiásticos e as demais pessoas privilegiadas da sociedade
ligada à Corte, quando se deslocavam para outro sítio longe de sua
residência, a serviço do Estado, ou do rei, e cuja conseqüência prática
foi pedir que os fluminenses que tivessem mais que uma propriedade, a
cedessem aos migrados, ordem que era extensiva às lojas e armazéns. Esta
lei esteve em vigor até 1818. Para se entender essa forte
arbitrariedade há que se entender o poder do rei em uma Monarquia
Absoluta onde o Estado era apenas um aspecto da glória do rei e não
havia separação nítida entre as ações, desejos e vontades do rei, tanto
no Estado como em sua vida particular, pois o rei é o senhor de tudo e
reinava no país como dono da casa e em casa como dono do país. A corte
do antigo regime estamental é entendida como uma imensa casa do rei, a
Casa Real, e essa posse chega a tudo, tanto é que a separação dos
fundos econômicos da Casa de Bragança e os fundos do Estado português
só serão resolvidos com a criação de um Erário Público no 1o Reinado,
por D. Pedro 1o Imperador do Brasil (1822-1831).
4) D. João 6o: (*13/5/1767 +10/3/1827), 27o Rei de Portugal, Duque de
Bragança, Barcelos e Guimarães, Marquês de Viçosa, Conde de Arraiolos,
é muito feio, baixo, gordo, bonachão, comilão chegando a devorar 3
frangos seguidos, arrematados por 4 ou 5 mangas, acompanhados por água,
uma vez que raramente bebia vinho, era sossegado e sem vaidades, não
gostava de roupas novas, muito carola e só foi rei porque seu irmão José
morre de varíola em 1788 e a mãe é, oficialmente, declarada louca!!!
em 1799, tornando-o Príncipe Regente, uma das causas desta loucura pode
ter sido a tremenda culpa que Dona Maria sentiu por não ter permitido
que seu filho D. José se vacinasse contra a varíola.
Porém,
apesar de uma aparente fraqueza ele representa a visão do futuro e da
adaptabilidade à nova ordem, pós-revolução francesa na Corte portuguesa,
é ele a querer vir para o novo mundo, é ele a querer ficar, e a fazer o
Brasil, (Colônia e Vice Reino de 1500 a 1808), virar Reino Unido de
Portugal, Brasil e Algarves (1808-1822), é ele a abrir os
portos brasileiros logo ao chegar em Salvador, BA, a 28/1/1808, num ato
que é considerado o início da nossa emancipação econômica, é ele em
Abril de 1808 a dar o Alvará de Liberdade Industrial que permite a
abertura da tecelagem, da manufatura de metais e alimentos, porém a
alegria dura pouco e os ingleses o forçam a taxar a mercadoria
brasileira em 16%, enquanto que a inglesa tem apenas taxa de 15%, o que
faz fracassar a indústria brasileira e o Brasil ser inundado com
produtos ingleses sem penetração na Europa por conta do Bloqueio de
Napoleão, (
relatam que vieram até patins para neve) é ele que a
12/10/1808 funda o Banco do Brasil para regular a moeda, porém o
desmando e a corrupção são de tal ordem e o dinheiro é emitido em tal
quantidade que o lastro de ouro é superado e o dinheiro perde o valor e a
respeitabilidade e, em 1821 carrega 5 mil contos de divida do público e
8 mil contos de dívida da Coroa. O Banco do Brasil fecha as portas a
23/7/1829,
insolvente.
É a D. João 6º que o Brasil deve o futuro de grande esplendor e poderio econômico do café no Império,
pois entrega com as próprias mãos aos vassalos mais chegados à corte,
as mudas de café que manda trazer da África, ele construiu o Jardim
Botânico, um observatório astronômico, um teatro, uma biblioteca
pública, a tipografia real, uma fábrica de pólvora, a Academia Militar, a
Academia da Marinha. É ele, finalmente, a ter a perspicácia e visão
política do futuro ao fazer o filho ficar, cá no Brasil, quando urge
voltar a Portugal para acalmar os ânimos dos reinóis indignados com a
ausência do rei,
é ele, D. João 6º, injustiçado pela história
oficial que não lhe dá a unanimidade ao julgar como sua, a decisão de
vir para o Brasil como estrategista competente que era é ele, sem
dúvida, a grande figura da Casa de Bragança desta corte no exílio e a
quem o Brasil deve sua existência como Nação. Ele foi um dos poucos
monarcas europeus a reinar continuamente durante a época napoleônica o
único a me tapear em todos os tempos como escreveu, sobre ele, Napoleão
em Santa Helena. Sua vida no Rio, na Quinta da Boa Vista, é
muito simples, acorda às 6,00 h., assiste à missa, é barbeado, toma o
café da manhã e discute a administração da cidade. Almoça ao meio dia
numa grande mesa oval e cercado por todos os nobres e dignitários e ao
fim é assistido pelos filhos, D. Pedro que segura a bacia de prata e por
D. Miguel que derrama água para que ele lave as mãos após a refeição. É
fato histórico, comprovado, que guardava frangos inteiros nos bolsos
das casacas engorduradas e puídas, Tobias Barreto informa que:
não havia registro de D. João VI ter tomado banho de corpo inteiro tanto em Lisboa como no Rio. Dorme um pouco após o almoço e depois cuida dos negócios, passeia pela cidade e visita a mãe. Dorme por volta das 23,00 h.
5) Carlota Joaquina: (*25/4/1777 +7/1/1830), é a 1a
filha de Carlos 4o de Espanha e de Maria Luisa, a fogosa rainha que
brigou com a Duquesa de Alba por ciúmes de Goia o grande pintor dos reis
de Espanha. Carlota era bisneta de Luís XV, tetraneta de Luís XIV,
ambos reis de França e profundamente orgulhosa de sua origem Bourbon,
era muito feia com um rosto anguloso e quase masculino, com barba e
bigode, com menos de 1,50 m e sonhava com a grandeza da Espanha, ela
detestava o Brasil não vendo a hora de voltar para a Europa, não houve
na corte no exílio, quem mais fez intrigas, e das mais ambiciosas,
inclusive para submeter o reino português aos domínios espanhóis ou
conseguir a Coroa de Espanha para si própria uma vez que seu pai Carlos
4o e seu irmão Fernando 7o estavam prisioneiros de Napoleão. Arrogante,
cruel, vingativa e impetuosa tinha um gosto espalhafatoso para roupas e
jóias tendo a cabeça adornada com um arranjo de jóias e plumas, foi
considerada a Messalina, a Maria Antonieta, de Portugal. Tentou
destronar o marido em 1805, mas foi impedida por D. João que passou a
viver separado dela. Ela vive irrequieta, se deslocando do palácio Real
no centro para um palacete num morro vizinho e para uma casa na praia
do Botafogo, sempre cavalgando pela cidade cercada por uma guarda
pessoal e exigindo que os passantes sejam quem forem, nobres ou
estrangeiros, parem se ajoelhem e façam reverências em sua passagem e
mandando sua guarda pessoal agredir quem não as faça, isto gera tantos
incidentes diplomáticos que D. João 6o isenta os estrangeiros desta
obrigação. Quando sua filha mais velha Maria Teresa se casa, em 1810,
com o primo D. Pedro Carlos, Infante de Espanha, ela fica furiosa e diz
que prefere a filha jogada num poço do que casada com seu primo. Ao
voltar para Portugal com D. João 6o levando 4.000 cortesãos a 25/4/1821
ela disse,
vou enfim encontrar uma terra habitada por homens, vivi 13 anos no escuro só vendo pretos e mulatos.
D. João e Carlota Joaquina, tiveram 9 filhos, entre eles: 1 Imperador e Rei, 1 Rei e 2 Rainhas: Maria Teresa,
princesa da Beira; mulher de Pedro Carlos, Antonio, morto jovem; Maria
Isabel, rainha mulher de seu tio Fernando 7o (1784-1833) rei de
Espanha; Pedro, 1o Imperador do Brasile Rei Pedro 4o de Portugal; Maria
Francisca, rainha mulher de Carlos 5o (1788-1855) rei de Espanha;
Isabel Maria, regente de Portugal (1826-1828); Miguel, que pelo
casamento com a filha de D. Pedro 1o, sua sobrinha, torna-se rei de
Portugal; Maria, morta solteira e Ana Maria, duquesa de Loulé.
6) A adaptação da Corte aos trópicos: A corte
endividada, e atônita, com a novidade dos trópicos encontrou na colônia
um tecido social que estava assim estruturado:
Já existia na
colônia uma aristocracia de poder econômico e privilégio social
composta de senhores de engenho, criadores de gado e fazendeiros
produtores de víveres e mercadorias, os quais agrupados em clãs
impenetráveis controlavam as áreas situadas em torno das principais
cidades litorâneas sendo que a aristocracia nordestina era simpática a
Portugal e a do sul era resistente ao poder real, (Alan Manchester).
A apologia do poder real enfatizava as propriedades inatas do
soberano com seu caráter paternal para com seu povo e sua procedência
divina e sua capacidade divina de conceder graças, benesses e títulos,
obviamente, sempre muito bem pagos. A nobreza migrada, composta da mais
alta nobreza desangue e espada, as famílias puritanas, como os Marialva
(1475), Penalva (1499), Abrantes (1504), Arcos (1620), Sabugosa
(1640), Angeja (1654), São Miguel 1663, Lavradio (1664), Alorna (1667),
Fronteira, Castelo Novo, São Lourenço, Óbidos, Gouveia, Ribeira
Grande, S. João da Pesqueira, Alvor, Sta Cruz, Vila Nova, Assumar,
Alva, Miranda do Corvo, e a nobreza de toga composta pelos comerciantes
de grosso trato nobilitados a partir de D. João 5o, que são mais
recentes e influentes nos cargos da administração do reino, como os
Anadia, Pombal, Vagos, Belmonte. No Brasil essas 2 nobrezas
empenharam-se em manter sua proximidade com o Rei e alargar as
distâncias que as separavam das elites da terra criando uma tensão
sócio-cultural que marca a estada da corte no Brasil e foi usada por D.
João 6o com maestria numa estratégia inteligentíssima para manter o
controle do país e da Corte e preservar a Dinastia Bragança. Os
emigrados passam suas primeiras semanas em completo estado de choque
cultural e emocional horrorizados com o clima, a insalubridade da
cidade e a vulgaridade dos brasileiros e apavorados com as tempestades
tropicais cheias de raios e trovões. As pesadas chuvas, calor e
pestilência eram insuportáveis para os exilados e o marquês de Borba
escreve, desesperado, para os familiares:
é um mundo novo, mas para pior!!!, eu nunca pensei terminar meus dias em terra de tanta abominação e escândalo. Marrocos, arquivista real, escreve ao pai,
só na Igreja da Misericórdia se enterrarão em 1811, para cima de 300 pessoas naturaes de Lisboa.
Os anos de 1817 e 1818 foram os mais faustosos da permanência da corte
no Brasil. Em particular o período entre a chegada da princesa Maria
Leopoldina Josefina Carolina Von Habsburgo-Österreich, (*22/1/1797
+11/12/1826), filha de Francisco 1º, Imperador da Áustria-Hungria e
Maria Teresa de Bourbon-Sicílias a 5/11/1817, para o casamento com D.
Pedro, Duque de Bragança e Príncipe do Brasil e o aniversário e
coroação e aclamação de D. João, a 13/5/1818, como monarca de uma
centenária Casa Real européia. Foram inúmeras festas feitas com doações
dos grandes negociantes nativos sempre com desfiles e arcos triunfais
pelas ruas da cidade que deslumbraram, pelo luxo, fausto e riqueza, a
população da cidade, pois eram acontecimentos totalmente inéditos para o
Novo Mundo.
7) A adaptação dos brasileiros à Corte: Os
sentimentos de vassalagem dos fluminenses se exprimem pelos muitos e
gordos donativos feitos para sustentar o dia a dia da corte que era de
manutenção caríssima e contínua, só em aves para a alimentação
gastavam-se 75 contos de réis por mês, e, praticamente o rei não tinha
nenhuma outra renda além da concessão das mercês, franqueada aos
vassalos, como já era praxe em Portugal desde D. João 5o, 24o rei de
Portugal, (1706-1750), e que era o principal capital econômico de que
dispunha a monarquia para sobreviver. Em 1800 conseguia-se em Portugal, o
Foro de Fidalgo por 25.000 cruzados e o Hábito de Cristo por 5.000
cruzados. Portugal foi diferente, das demais nobrezas territoriais
européias, por não basear o seu estado, e o seu poder, exclusiva ou
majoritariamente, nos senhorios da terra, lá havia uma categoria de
nobre genuinamente lusitano, o fidalgo mercador. A partir do Marquês de
Pombal, no século XVIII, se consolida em Portugal a importância dos
grandes comerciantes com ofícios e cargos civis na sociedade portuguesa
que participam da máquina administrativa e lutam pelo ideal da
nobilitação uma vez que estão ficando cada vez mais ricos e poderosos,
enquanto que a velha nobreza decaía e se endividava cada vez mais.
8) A Quinta da Boa Vista: D. João se instala na
Quinta da Boa Vista (São Cristóvão) que recebe em doação do comerciante
Elias Antonio Lopes, e a quem ele confidenciou maravilhado (sic):
Eis aqui huma varanda Real, Eu não tinha em Portugal cousa assim. Porém, essa casa não convence como residência real a John Luccock que a considera:
acanhada e pretensiosa, mal construída e pessimamente mobiliada.
Dona Maria fica no convento do Carmo. Carlota Joaquina fica na antiga
sede do vice-reino no centro da cidade, que vira o Palácio Real, com
63,98 m. por 23,76 m. de área, sendo absolutamente desprezível como
habitação real: um casarão sem nenhum mérito arquitetônico. Em 1817 a
comitiva austríaca de dona Leopoldina se decepcionará com o palácio,
que acha sujo e malcheiroso reclamando do estrume no terreno do paço e
das nuvens de insetos que atraíam e comentam que:
qualquer fidalgo alemão provinciano dispõe de uma residência mais bonita.
A Corte se instala no que há de melhor na cidade, que é acanhada e
extremamente provinciana e deixa muito a desejar perto do que fora feito
de grandioso pelo Marquês de Pombal na Lisboa pós-terremoto de 1755,
com a enorme quantidade de ouro brasileiro enviada a Portugal.
A Quinta da Boa Vista avaliada em 400 cruzados rendeu a Elias a
Comenda da Ordem de Cristo e o titulo de Cavaleiro da Casa Real, Elias
ao morrer, em 1815, deixou uma fortuna de 235:908$701 (duzentos e trinta
e cinco contos novecentos e oito mil setecentos e um réis) e, ainda
mais, 110 escravos avaliados em 9 contos de réis.
9) A nobreza Brasileira com D. João VI: Manuel José
da Costa Filgueiras Gayo informa no Nobiliário de Famílias de Portugal,
que o foro de Cavaleiro ou Escudeiro era sinal de nobreza de sangue,
principalmente, quando esse título já era usado antes da reforma de D.
Sebastião em 1572 reforma esta, que simplificou, e facilitou as
exigências para qualificar os novos titulares já inseridos na nova
dinâmica social de grandes fortunas que começa a imperar entre a nobreza
de Portugal a partir do século XVII.
Cabe aqui, uma referência histórica familiar, pois no século XV,
meu 13o avô, João de Arantes, Morador da Casa Real e Senhor da Quinta
de Romay, foi feito por El Rei D. João 2º (13o Rei de Portugal entre
1481-1495) de quem era companheiro de armas, Condestável dos
Espingardeiros a 2/1/1488, (conforme o documento histórico que confirma
esta nomeação), e ele já era qualificado como Cavaleiro Fidalgo de
sangue e espada.
Foram os comerciantes de grosso trato fluminenses, (
que tinham
preponderância sobre os outros setores econômicos existentes na colônia,
como os comerciantes reinóis e a aristocracia agrária nativa), que ajudaram a manter o passadio da corte e foram agraciados com Comendas e Títulos:
Manoel Caetano Pinto cuja fortuna, em 1839, era de 280 contos de réis,
José Inácio Vaz Vieira,
Antonio Gomes Barroso,
Antonio José Ferreira, genro de
Manoel Caetano Pinto,
com fortuna de 300 contos de réis, e vários outros, entre eles o mais
influente, Brás Carneiro Leão (1732-1808), o maior e mais poderoso dos
negociantes de grosso trato do Rio de Janeiro que, já em 1802, fora
agraciado com a Ordem de Cristo e era Cavaleiro da Casa Real e tinha
carta de brasão para si e seus 6 filhos. Louis de Freycinet, comentando
a vida social do Rio informa que ficou atônito com a opulência das
mulheres da família de Carneiro Leão as quais
usam jóias de tal magnificência que apenas os diamantes são avaliados em 6 milhões de francos!!
A viúva de Brás Carneiro Leão, Ana Francisca Rosa Maciel da Costa, é
feita por D. João 6o, Baronesa de São Salvador de Campos, a
17/12/1812,
que é o 1º brasileiro nato a receber mercê de título nobiliárquico no Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.
Ela inicia uma exuberante quantidade de nobres brasileiros que será
agraciada no Império com importantes títulos e postos. De Brás Carneiro
Leão e Ana Francisca descendem os 11 titulares abaixo:
Uma filha, Luisa Rosa Carneiro da Costa (1786-1843), casou-se com
Paulo Fernandes Viana, Chefe de Polícia, que era íntimo de D. João 6o e
administrava a cidade do Rio, e deste casal descendem: Paulo, Conde de
São Simão; Maria, Marquesa de Cunha e Ana Luiza, Duquesa de Caxias.
Um filho, José Fernando Carneiro Leão, que tinha o hábito da Ordem de
Cristo desde 1810, será Conde de Vila Nova de São José e diretor do
Banco do Brasil, (
sua mulher foi assassinada em Outubro de 1820 e a
suspeita cairá sobre Carlota Joaquina que estaria interessada em seus
favores amorosos).
Outra filha casa-se com o filho de Rodrigo de Souza Coutinho, 1o Conde de Linhares em 1808, Ministro de D. João 6º
,
que é o exemplo típico da nova nobreza portuguesa iniciada por D. João
V, pois representa a nobilitação de mercadores de grosso trato sem
nenhuma ascendência de linhagem nobre de sangue, ele era atarracado com
cabelos encaracolados e de cor tão morena que os seus desafetos na
Corte suspeitavam que ele tinha sangue africano. É filho de um
governador de Angola no tempo do Marquês de Pombal que é seu padrinho e
quis que o afilhado representasse uma nova nobreza ativa, educada e
preparada.
Outra filha, Ana Carneiro da Costa, será a 1a Viscondessa de Cachoeira.
Outro filho, José Alexandre Carneiro Leão, será Visconde de São Salvador de Campos.
Outra filha, Francisca Mônica Carneiro da Costa, será Marquesa de Baependi, e mãe do Conde de Baependi e do Barão de Juparanã.
Sua neta Mariana será Marquesa de Jacarepaguá.
Sua bisneta Francisca será Viscondessa de Carapebús.
10) Estilo de vida e hábitos dos brasileiros do Rio:
Era essa a rotina de vida dos ricos fluminenses: levantavam às 9h.,
desjejum às 10h., trabalhavam até às 15h., fazem em seguida uma longa
sesta e, às 20h., tomavam um chá com a família. Quando eram convidados
para a casa de amigos iam às 19h. e voltavam às 23h. Quando tinha baile
voltavam às 2 ou 3 horas da madrugada. O almoço/jantar começava com
uma sopa de carne com legumes, seguida de frango com arroz e molho
picante, entre cada prato uma colherada de farinha de mandioca como se
fosse o pão e, para refrescar o paladar, comiam laranjas e saladas.
Como sobremesa tinham o arroz doce, queijo de minas, holandês ou
inglês, frutas variadas e, para beber, porto ou madeira e o café.
Somente os homens usam a faca, mulheres e crianças se servem com os
dedos e as escravas comiam ao mesmo tempo, em pontos diversos da sala
sendo que, por vezes, suas senhoras lhes dão um bocado com as próprias
mãos. Os estrangeiros sentiam repugnância pelo prato de carne seca de
Minas com feijão preto e farinha de mandioca, tudo isso cozido e
amassado com os dedos que são lambidos no final.
Quanto à
higiene pessoal, o inglês Henry Koster reparou na cuidadosa limpeza com
o próprio corpo que os brasileiros de toda classe tem.
A mulher: vivia confinada, privada de liberdade, num
contínuo isolamento, sempre fechada em casa e mesmo entre a nobreza
vigorava a norma da província, de que a mulher só três vezes saía de
casa, para ser batizada, para se casar, para ser enterrada. As mulheres
costumavam sentar-se em esteiras, de pernas cruzadas à maneira
oriental, junto às janelas rodeadas de escravas para servi-las. O ócio e
a falta de exercícios rapidamente deformavam o corpo das adolescentes
que, aos 13 anos assumiam o papel de matronas e, aos 18, já atingiam a
plena maturidade física. A beleza feminina da época ia da moça do tipo
quebradiço, quase doentio, à mulher gorda, mole, caseira, maternal, de
coxas e nádegas largas, com pezinhos deformados por sapatos apertados
demais, feitos de seda nas cores branca, azul, celeste, rosa, que duram 2
dias, pois as calçadas são péssimas, só em 1818 chega a moda dos
sapatos envernizados de couro que são caríssimos. A cintura de vespa era
apertada pelo espartilho. Os cabelos eram longos e com todos os
formatos arquitetônicos possíveis e com nomes pitorescos:
tapa missa e trepa moleque. Usavam xales de seda, lã, pelo de camelo, renda, tricô, musselina bordada de ouro ou prata.
O homem: sempre de barba e/ou bigode, se vestiam
como ingleses e tinham como característica o fardamento das diversas
ordens, com guarda roupa composto de calças, calções, camisas, casacos,
sobrecasacas, chambre de seda, lenços e gravatas, meias de seda,
chapéus, jaquetas e xales de lã, tudo sempre muito colorido.
A vida social: é muito chata e as distrações pouco
freqüentes, pois quase não há reuniões sociais. Os jantares, bailes ou
reuniões em casa particular, são coisas quase inexistentes. O 1º teatro
foi construído por D. João e inaugurado a 12/10/1813, com o nome de
Teatro São João, continha 1.020 poltronas e 112 camarotes.
Carlota Joaquina, sempre descontente e odiando o Brasil, achava o Rio sem nenhuma sofisticação e julgava a cidade repugnante,
terra de macacos e negros.
11) Como os Bragança criam uma dinâmica social brasileira:
Graças a Napoleão, que provoca a mudança da Corte, tivemos a inserção
política do Brasil no Reino de Portugal e a chance de crescer como
nação no novo mundo que emerge do turbilhão social que varre a Europa e
começa a reestruturar a sociedade européia, pós-revolução francesa,
abrindo vários caminhos para o desenvolvimento, pois um rei Português,
forte, independente e bem instalado, na distante Lisboa,
jamais
teria dado liberdade para que uma classe dirigente do Brasil Colônia
ficasse rica e poderosa o suficiente para pleitear sua inserção no
teatro social centenário da Corte recebendo dignidades e títulos
nobiliárquicos. Entretanto o início econômico do Brasil, como
nação, foi engolfado pela Inglaterra que se aproveita da debilidade da
Corte no exílio e abusa de sua força estrangulando o incipiente
desenvolvimento comercial brasileiro. A configuração social da corte de
D. João 6º no Brasil é composta de uma mistura da nobreza européia
centenária, quase falida, e de nobres de toga bem mais recentes que eram
os ricos vindos da classe comercial, graças à política de
enobrecimento do Marquês de Pombal e, tambem, da elite da terra
brasileira que tinha enorme riqueza e se liga à Corte
honrados/cooptados com as Insígnias das Ordens centenárias e com
Brasões de Armas, dados como prêmio de relevantes serviços prestados ao
rei e, principalmente,
às grandes doações que permitiram a manutenção do fausto da Corte falida,
tudo isso reproduz a mesma dinâmica social estabelecida em Portugal
desde D. João 5o (1706-1750). Para conseguir renda e manter a Corte,
durante o período que passou no Rio, D. João 6º concedeu
títulos a 28 marqueses, 8 condes, 16 viscondes e 21 barões, além de fazer 4.000 cavaleiros. Tal quantidade foi criticada por Pedro Calmon que satiriza esta prodigalidade:
tornar-se conde em Portugal exigia 500 anos, no Brasil apenas 500 contos.
Esta prodigalidade do Rei D. João 6º consegue, graças a essa
inteligentíssima estratégia, exterminar as possíveis ilusões
democráticas pós-revolução francesa e lhe permite administrar e
controlar, todas as classes sociais na
dourada cadeia da subordinação ao Rei,
sempre tendo em vista a preservação da pirâmide monárquica na qual
esses ricos nativos brasileiros querem se inserir e mantém sob rígido
controle tais indivíduos em seus ofícios e no devido respeito à sua
autoridade Real, garantindo a sobrevivência da Dinastia, pois
o
Rei nesta sociedade estamental de uma monarquia absoluta, é o único
dono de tudo e de todos no Reino que é a sua Casa, onde ele faz o que
quer, quando quer. Esta semente de estrutura social, lastreada na
ambição de ascensão social da elite brasileira,
irá frutificar com tremenda intensidade no Império que se instala após
a volta de D. João 6º a Portugal em 1821, quando os 2 Imperadores se
valem desta
forte ambição de ser nobre que tem a elite brasileira,
para sustentar o Império e lançar as bases da permanência de sua
dinastia no Novo Mundo cercando-se, em apenas 67 anos, de barões,
viscondes, condes e marqueses num total de 986 titulares que recebem
1.211 títulos (assim divididos: 3 Duques, 47 Marqueses, 51 Condes, 235
Viscondes e 875 Barões) que tudo devem ao Imperador que lhes concede
esta benesse apenas
ad personam (= de caráter pessoal isto é, vale
apenas para o agraciado durante a vida, não sendo a nobreza brasileira
hereditária, detendo o Imperador o poder total de administrar com mão
de ferro a sucessão do título e manter as famílias sob sua completa
dependência, num aprimoramento muito esperto/ardiloso do que fazia D.
João 6º).
Essa multidão de nobres sustenta e protege o
Império dos perigosos ventos democráticos que assolavam a Europa
pós-napoleônica com toda a lealdade, fidelidade e interesse em
perpetuar esta Dinastia que os dignifica como nobres e que,
provavelmente, teria se mantido se houvesse um herdeiro masculino para
ser Pedro III.
Bibliografia consultada para estruturar este trabalho:
O Brasil no Tempo de D. Pedro II, Fréderic Mauro, Cia. das Letras, 1991.
A Cidade e o Planalto, Gilberto Leite de Barros,
Martins, 1967, I Tomo, em especial as pgs: 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15,
16,17, 19, 21, 22, 23, 27, 28, 29, 35, 36, 37, 38, 40, 41, 44, 45, 49,
53, 54, 57, 60, 82, 83, 85, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 123, 124, 164, 168,
169, 173, 174, 180, 186, 188, 191, 193, 196.
A Corte no Exílio, Jurandir Malerba, São Paulo,
2000, com vários trechos citados, em especial as pgs: 307, 219, 328,
220, 221, 222, 216, 329, 363, 297, 323, 202, 213, 212, 257, 330, 331,
335, 324, 325, 326, 234, 279, 280, 281, 298, 299, 258, 262, 16, 17, 173,
24, 311, 308, 255, 256, 259, 260, 261, 262, 263.
As Barbas do Imperador, Lillian Schwarcz, São Paulo, 1996.
Titulares do Império, Carlos Rheingantz, Rio de Janeiro, 1960.
Ensaio Geral, 500 Anos de Brasil, Heródoto Barbeiro, Bruna Cantele, São Paulo, 1999.
As 4 Coroas de D. Pedro I, Sérgio Correa da Costa, Paz e Terra, 1996.
Anuário Genealógico Brasileiro, 1 Anno pgs: 85, 258 a 260, 2o Anno pgs: 21 a 74 e Vol. IX (Penúltimo), São Paulo, 1947.
Carlota Joaquina na Corte do Brasil, Francisca Nogueira de Azevedo, Civilização Brasileira 2003.
Brasil Terra à Vista Eduardo Bueno, L&PM 2003.
Brasil: uma História Eduardo Bueno, Ática, 2003.
Pedro II do Brasil, Glória Kaiser, Rio de Janeiro, 2000.
Império à Deriva, Patrick Wilcken, Editora objetiva, RJ, 2004,várias páginas tem trechos citados.
História do Brazil, Rocha Pombo, Benjamin de Aguila, Edição Ilustrada.
Anuário Genealógico Brasileiro, Ano IX (Penúltimo).
Brasil: uma História, Eduardo Bueno, Atica, 2003.
A reordenação urbanística da nova sede da Corte, Nireu Oliveira Cavalcanti.
1808, Laurentino Gomes, Planeta, 2007.
Versalhes Tropical, Kirsten Schultz, Civilização Brasileira, 2008.
Diários de um Rei Exilado, Alejandro Maciel, Landmark, 2005.
Dona Leonor de Távora, Luiz de Lancastre e Távora, Quetzal, Lisboa, 2003
História de Portugal, 4º Volume, José Mattoso, Estampa, 1998. Coletânea de textos.
Um espelho distante, Bárbara Tuchman, Jose Olympio, 1999.
A história da fundação do Banco do Brasil Edição Kok&Martins, 2007
Gold: true cost of a global obsession, National
Geographic, January/09: a quantidade de ouro enviada do Brasil é
controversa, neste artigo é informado que ao longo de TODA a história
humana a mineração só foi de 161.000 toneladas de ouro das quais 50% nos
últimos 50 anos, pág. 43 e a produção em 2007 chegou a 3.800
toneladas, pg. 53.
fonte: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=444